segunda-feira, 17 de abril de 2017

Íz (Goiânia - GO) - 14/03/2017


Estávamos decepcionados com a capital de Goiás. Além de já ter poucas atrações turísticas, pegamos dois museus fechados em dias em que deveriam estar abertos. Então a visita ao Íz (que significa "paladar" em húngaro) era a última esperança de redenção para a cidade. O restaurante foi eleito um dos cinco melhores do centro-oeste em 2016, pela revista Prazeres da Mesa, e chegamos lá com as expectativas altas para conferir o trabalho do jovem chef Ian Baiocchi, que abriu seu empreendimento em 2015.

Íz, redima sua cidade ou morra tentando!

Chegamos de carro, e pudemos notar no caminho que o Íz está inserido em um bairro de classe média alta de Goiânia. Instalado em uma rua tranquila, o restaurante tem uma fachada elegante, iluminação baixa e o nome do lugar escrito em luz branca, dando a impressão de que está flutuando no ar. As paredes de vidro permitem ver o ambiente interno, e do lado de dentro elas dão um efeito bacana, como se o restaurante fosse aberto, mas com todo o conforto de um ambiente fechado. As mesas encostadas às paredes contam com sofás. Chris chegou a se sentar em um deles, mas não gostou muito e "se mudou", porque ficavam longe da mesa. Há também um bar com banquinhos, e um ambiente de espera, para os dias mais cheios.



"Acho que vou me mudar, sabe?"


Um vulto passeia na lua cheia

O cardápio começa com os pratos "Para compartilhar", onde estão as entradas e o couvert. Ali já deu para ver que a proposta da casa é uma cozinha moderna, com toques criativos e uso diferenciado dos ingredientes, como pode ser notado no queijo coalho tostado, servido com falso caviar de jabuticaba, melado de cana e pó de manteiga de garrafa (R$ 34). Mas nossa escolha foi ainda mais fora da caixinha: Caprese Molecular (esféricos de burrata, mini croutons de ciabatta, tomate confit, manjericão e balsâmico envelhecido, R$ 38), uma recriação, servida em colher, da famosa salada italiana. Apresentação linda, com oito colheres prontinhas pro crime. Eu adorei os sabores e as texturas, e me deliciei com cada colherada. Chris gostou menos, achou que as esferas de burrata pareciam manteiga, e sentiu que faltou mais tempero. Para ser honesto, também achei que uma pimentinha daria um belo tchans no sabor. Minha cara de pidão não sensibilizou, e Chris comeu as quatro colheres a que tinha direito, mesmo sem ter gostado tanto.

The Taste Goiânia

"Ah, me deixa comer ao menos cinco, vai?"

O cardápio do Íz é do tipo que adoramos: apenas nove opções de pratos principais. Sinal de que existe um filtro para se colocar algo no menu, e bom indício de que qualquer pedido vai ser executado com extremo cuidado. Apesar de pequeno, o menu contempla opções com frutos do mar, carnes bovina, suína e de pato, além de um nhoque. Todos os pratos são individuais, e custam em média R$ 83. A pegada é a mesma das entradas, com opções criativas como o pirarucu a la plancha, servido com paçoca de rabada, purê de banana e tartar de banana-da-terra (R$ 79). No dia de nossa visita também havia outros três pratos disponíveis, que não constavam no cardápio fixo.

Chris escolheu o filé mignon sautée (com manteiga de ervas, mandioquinha gratinada com panceta da casa, aspargos salteados e redução de vinho do Porto, R$ 88). Com o tempo aprendemos uma pegadinha: quando pedimos a carne mal-passada da Chris, não avisamos que é para ela, ou até damos a entender que é para mim. Não sei se foi isso, mas o fato é que o filé veio sangrando, do jeito que ela gosta (e, sim, o garçom achou que era meu). Além desse acerto, Chris adorou a mandioquinha, servida em duas "torres", junto com a panceta. Os aspargos estavam gostosos e torradinhos por baixo. O principal problema do prato era também sua maior qualidade: o molho que se formou, com a manteiga de ervas, a redução de vinho do Porto e o sangue, estava uma delícia. Mas nenhum ingrediente tinha a capacidade de sorver essa maravilha, que acabou ficando no prato. Talvez os aspargos, gostosos mas sem muita função, pudessem ser substituídos por algo com essa característica "sugadora".

"Um pãozinho, tens?"

É bastante raro encontrar cupim como prato principal em restaurantes, por isso eu, que adoro o corte, não poderia deixar de pedir o cupim braseado (com roti de pimenta de cheiro, ratatouille caipira e farofa de limão china, R$ 81). Quando o prato chegou, servido de forma simples e direta, coloquei meu garfo na carne, para cortá-la, e notei que não precisaria da faca. O cupim simplesmente desmanchou ao toque do garfo. Tão importante quanto a textura, o sabor estava incrível. Juntando com a farofa de limão, com o cítrico presente mas discreto, e os legumes bem temperados, trazendo frescor e cor, chegamos a algo da prateleira dos prodígios. E, de forma didática, aqui havia o que faltou no prato da Chris: a farofa para absorver o roti. Ah, o limão china, que estranhei ao ler, é o que conhecemos no Sudeste como limão-cravo. 

Não me contento em ver essa foto, quero mordê-la

Acompanhamos nossa refeição com um vinho malbec argentino Alto las Hormigas 2014 (375ml,  R$ 57). Acabo de pesquisar na internet seu preço, e encontrei por R$ 46. Ao menos o restaurante não quis nos extorquir cobrando o dobro do preço.

Empolgados com nossos pratos principais, resolvemos pedir uma sobremesa para cada, ao invés de escolher uma para dividir como normalmente fazemos. São apenas cinco opções (porque não considero "frutas da estação" como uma sobremesa, tá?)

Chris escolheu a torta fondant, feita com chocolate callebaut 70%, merengue e sorvete de baunilha, caramelo, especiarias e flor de sal (R$ 32). Apresentação bonita, com a louça combinando com as cores da sobremesa. O toque de flor de sal não emocionou a Chris a ponto de ela abstrair o fato de que merengue + chocolate formaram uma combinação doce demais para seu paladar. E nem vou escrever que ela chamou de "petit gateau metido à besta". Ops, escrevi...

Metido a quê, menina?

Eu escolhi a a ambrosia do palácio, acompanhada de sorvete de banana marmelo, mirtilo passa, canela crocante e "coulis secreto" (R$ 34). Apresentação bonita, mas achei o prato muito fundo, dificultou um pouco para comer. Também achei que havia um excesso de informações, com o coulis muito doce anulando um pouco o gosto da ambrosia. Achei interessantes os mirtilos passas, e a falsa canela, que deu uma crocância. Mas mordi com força uma cravo que certamente não deveria estar ali, e prejudicou meu paladar.

Ache o cravo escondido e ganhe um gosto ruim na boca de brinde

Rafael foi o garçom que nos atendeu na maior parte do tempo. Atencioso, com conhecimento do cardápio e muito simpático, embora ligeiramente invasivo em alguns momentos, quando ficava muito perto da mesa esperando nossos pedidos. Sérgio, que parecia ser o maitre, nos apresentou aos pratos que não estavam no cardápio fixo, e se alongou por muito tempo nas descrições, poderia ter sido mais sucinto. Se mostraram atentos quando saímos para a Chris fumar, nos levando um banquinho e um pratinho para ela bater as cinzas. O serviço foi bem ligeiro, com os pratos saindo da cozinha em não mais do que vinte minutos.

Ao fim, minha experiência foi sensivelmente mais satisfatória do que a da Chris, e portanto tivemos opiniões diferentes quanto à uma possível volta ao Íz. Chris achou que o custo-benefício não valeria um retorno. Já eu fiquei encantado com os sabores da entrada e com o maravilhoso cupim, e voltaria ao lugar para provar outros itens do cardápio. Se o restaurante foi a redenção esperada para a capital goiana? Ao menos para um de nós, a resposta pode ser um retumbante "sim".

AVALIAÇÕES (Primeira nota da Chris, segunda nota do Fê; ao lado do quesito está o peso dele na média final):

Ambiente(2): 7 e 7,5
Serviço(2): 7 e 7,5
Entrada(2): 6 e 8
Prato principal(3): 8 e 9
Sobremesa(2): 5,5 e 6
Custo-benefício(1): 6 e 7,5
Média: 6,16 e 7,70
Voltaria?: Não e sim

Serviço:
Rua 1129, 146 (Quadra 237, Lote 30) - Setor Marista - Goiânia - Goiás
Telefone: (62) 3092-5177
Site: http://izrestaurante.com.br/
Facebook: https://www.facebook.com/izrestaurante/?fref=ts

Montserrat (Pirenópolis - GO) - 11/03/2017


Cento e sessenta e oito quilômetros. Essa foi a distância percorrida para podermos almoçar no Montserrat, em Pirenópolis. A explicação: estivemos hospedados na cidade durante a semana, quando o restaurante não abre. Nossa visita se deu quando já estávamos instalados na cidade de Goiás, e portanto tivemos que fazer o percurso de volta, em um sábado. Mas por que tanto esforço para apreciar a gastronomia do chef catalão Juan Pratginestós? Resposta: a sanha de colecionador deste que vos escreve. O Montserrat é o único restaurante em todo o estado de Goiás que faz parte da Associação dos Pratos da Boa Lembrança, confraria cujos associados entregam pratos decorativos de brinde aos clientes que pedem um determinado item do cardápio.

Chegamos ao restaurante por volta de uma da tarde de um dia ensolarado. Não fosse a logomarca do restaurante e as mesas na varanda, daria para confundir o lugar com uma bela casa, com seu muro de pedras, algumas pequenas árvores e até uma caixa de correio. Sua localização é privilegiada, à beira do Rio das Almas, que cruza o centro de Pirenópolis, e em frente a um bambuzal. Há um ambiente interno, pequeno e climatizado, mas claro que escolhemos uma mesa na varanda, onde, raridade das raridades, era até permitido fumar. Destaque negativo para as cadeiras, bastante desconfortáveis para quem vai passar cerca de duas horas sobre elas. 

Donde nóis num fiquemo

Donde nóis fiquemo

"Quer me ver feliz, me dê um cinzeiro"

Há três entradas frias e cinco entradas quentes no cardápio. Parte delas tem influência espanhola, como a Tortilha de Dona Montse (mãe do chef Juan, e inspiração para o nome do restaurante), que traz uma prato clássico da culinária do país, uma espécie de omelete. Para não fugirmos da terra natal do chef, ficamos com as iscas de filé ao Jerez (filé salteado com alho e cebola, com molho do fundo da carne e vinho Jerez, servido com pão da casa, R$ 30). Pão muito gostoso, macio, mas sem aquela consistência murcha. Carne também macia, cortada em tamanhos adequados. Molho delicioso, com o vinho Jerez presente, mas não de forma agressiva. Como disse a Chris, se eu estivesse em casa certamente teria lambido o prato. Mas mantive a urbanidade.

"Eu nego que vá lamber esse prato"

Antes de falar dos pratos principais, vale um registro sobre o aspecto físico do menu. São folhas de papel pardo impressas, listando os pratos, suas descrições e preços. Mas aqueles que couberam a nós estavam um pouco apagados, e às vezes isso dificultava um pouco a leitura de alguns itens. Quantas às opções, são muitas, mais de vinte, com influências diversas, desde a já citada espanhola, até italiana, portuguesa e húngara. Os pratos são individuais e, à exceção da seção de frutos do mar que é um pouco mais cara, ficam numa média de R$ 47. Entre aqueles que quase pedimos estavam o risoto de rabada e o frango "al chilindrón", uma preparação à base de molho de tomate e pimenta, tipicamente espanhola.

Chris não teve muita escolha em relação ao seu prato principal. Como já dito anteriormente, o Prato da Boa Lembrança só é entregue mediante o pedido de um determinado prato, que no caso do Montserrat envolvia bacalhau, pescado de que não sou fã. Então a Chris ficou com o Bacalhau com samfaina e batatas em salsa verde (R$ 95). Eu falei antes sobre o preço dos pratos, mas faltou dizer que existe uma "inflação", à qual já estamos acostumados, no caso dos pratos da Boa Lembrança. Explicando, a samfaina, que não conhecíamos, é uma preparação feita com vários legumes (abobrinha, berinjela, pimentão, tomate e cebola), também conhecida como "ratatouille catalão".

Aos sabores, pois. A samfaina estava gostosa, com sabor bem picante. Chris adorou as batatas, que são puxadas na manteiga e vinho branco. Ela conseguia sentir o sabor do vinho de maneira sutil, como deve ser. O bacalhau também estava bom, mas ela achou o todo muito molhado, faltou algo para reter tanto caldo. Mas o pior defeito do prato foi mesmo a proporção. Uma quantidade muito grande de comida, que transformou o que era gostoso em algo enjoativo ao final da refeição. Se a samfaina e as batatas viessem na proporção do pedaço de bacalhau, seria perfeito. Chris deve ter comido, no máximo, dois terços do que havia, e claro que isso prejudicou sua apreciação final.


Menos, bem menos, Sr. Juan!

Resolvi fazer um pedido fora da culinária ibérica, e escolhi o goulash com fettuccine (carne guisada com cebola, tomate, caldo de legumes, vinho branco e páprica, com fettuccine puxado na manteiga e salsinha, R$ 46). Trata-se de uma receita húngara, aqui acompanhada de macarrão na manteiga. A carne estava bem macia. Quando experimentado sozinho, o macarrão estava um pouco sem graça. Sorte que o molho do goulash estava bem gostoso, o que salvou algumas garfadas. Eu digo algumas porque o molho não foi suficiente para dar sabor a todo o macarrão. E aí entra o mesmo problema do prato da Chris: erro na proporção. Basta ver a foto para saber que é muito macarrão para pouco goulash - e é bom deixar claro que, para mim, deveria vir menos macarrão, e não mais goulash, para vocês não acharem que eu sou um ogro.

Sr. Juan, eu já não disse pra colocar menos?

O cardápio ostenta com orgulho o fato de os sorvetes da casa serem feitos em uma sorveteira (SORVETEIRA, e não SORVETERIA) italiana Carpegiani dos anos 50. É a moda do vintage como agregador de valor. Por conta disso,  três das quatro opções de sobremesa tem sorvete na composição - nada contra, diga-se. O mais comum é dividirmos essa etapa da refeição, mas decidimos fazer pedidos separados. Ao final aconteceu algo curioso, já que, ao experimentarmos o prato um do outro, resolvemos trocar, mais ou menos quando já estávamos na metade deles. Mas as notas ao final são dadas para os nossos pedidos originais. 

Chris pediu a ganache de café (com chocolate meio amargo e café, servido com calda de morango, R$ 16). Como ela adora café, achou esse ingrediente muito sutil na receita, que acabou ficando muito doce. Ela imaginou que uma calda, talvez com algo alcoólico, poderia dar uma quebrada nisso. Mas ela gostou bastante. Eu, que comi metade, achei uma delícia, até porque não sou mesmo muito fã de café. E morango com chocolate é covardia, né?

Covardia!

Apesar de minha afirmação acima de que não gosto de café, também não sou chegado em coerência, e pedi as mantecadas com sorvete de café (antigo biscoito catalão feito com farinha de amêndoa, trigo e banha de porco, com sorvete de café e cardamomo, R$ 16). Eu simplesmente não resisti à descrição do que são as tais mantecadas. Apresentação muito bonita, com os biscoitos vindo bem quentinhos, e com sabor bem intenso. Mas o sorvete de café tinha muito gosto de café (se eu estivesse falando, e não escrevendo, seria o momento de eu ser xingado pelos meus interlocutores pela obviedade da declaração). Ok, xingamentos à parte, o fato é que o sabor forte da mantecada com o sabor forte do café foi uma briga dura demais, em que os dois saíram perdendo.

Ninguém ganhou com tanta violência

A garçonete que nos atendeu parecia nova na função, mas era muito esforçada. Com o restaurante relativamente cheio na parte de dentro, havia entre nós a preocupação de sermos esquecidos na varanda, coisa que aconteceu raríssimas vezes, e por pouco tempo. Outro funcionário, que parecia ser o maitre, vinha a todo momento perguntar se estava tudo certo, parecia estar supervisionando o trabalho da colega.

Chegamos a tomar um susto no começo do atendimento, quando a garçonete nos disse que o Prato da Boa Lembrança só era servido no jantar. Ao ver a cara de decepção da Chris ela se compadeceu genuinamente, e voltou à cozinha para ver se era possível dar um jeito. O jeito foi dado, mas talvez isso explique porque demorou quase uma hora para que os pratos principais fossem servidos. No restante do serviço o tempo de espera foi dentro da normalidade.

Os preços do Montserrat não são nada absurdos, o atendimento é bom e o ambiente, apesar das cadeiras duras, é agradável. O sabor dos pratos, se não foi inesquecível, ficou longe de ser ruim. O maior problema que encontramos foi uma falta de sutileza e de cuidado no porcionamento. Como isso aconteceu com os dois, parece algo crônico. Por conta disso, depois de termos dirigido quase 350 quilômetros, entre a ida e a volta, para almoçarmos ali, chegamos à conclusão de que não faríamos isso de novo. O que não significa, de maneira nenhuma, que tenhamos nos arrependido de fazê-lo. Afinal, o mais importante é que o colecionador obsessivo tem mais um Prato da Boa Lembrança. E o Montserrat será, no final das contas, uma boa lembrança.

AVALIAÇÕES (Primeira nota da Chris, segunda nota do Fê; ao lado do quesito está o peso dele na média final):

Ambiente(2): 6 e 6,5
Serviço(2): 8 e 7
Entrada(2): 7 e 7,5
Prato principal(3): 6,5 e 6,5
Sobremesa(2): 7 e 6,5
Custo-benefício(1): 7 e 6,5
Média: 6,87 e 6,75
Voltaria?: Não e não

Serviço:
Rua Ramalhuda, 11 - Beira-rio - Pirenópolis - Goiás
Telefone: (62) 3331-2628
Facebook: https://www.facebook.com/pages/Montserrat-Gastronomia/288690241331893







quarta-feira, 5 de abril de 2017

Flor de Ipê (Goiás - GO) - 10/03/2017


É preciso dizer, não visitamos o Flor de Ipê com o pensamento de incluí-lo aqui no blog. Estávamos na cidade de Goiás, terra da poetisa Cora Coralina, e era o restaurante mais próximo à nossa pousada. Estávamos cansados das andanças pela cidade, que é Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco, e fomos para um jantar informal, sem muitas pretensões. E de fato o lugar é despretensioso. Mas ao final achamos que a experiência valeu para uma inclusão aqui no blog. Por conta dessa "informalidade" da visita, pedimos desculpas pelas fotos, que não foram tiradas com o cuidado de sempre.

A fachada é discreta, parecendo a entrada de uma casa. Na parte de dentro o ambiente também é bem informal, com paredes recheadas de quadros e um pouco de artesanato, um jardim anexo e a vista para o Rio Vermelho. Embora a tal vista tenha sido atrapalhada pelo negrume da noite, era possível ouvir o barulho do mítico rio eternizado por Cora Coralina em suas poesias. De dia deve ser bem bonito visitar o lugar.

Dá pra ouvir o barulho do rio?

E tem jardim pra dar uma pitada

O cardápio de beliscos tinha opções muito pesadas, como por exemplo o medalhão de filé acompanhado de feijão tropeiro, mandioca e vinagrete (R$ 35). Não era o que pretendíamos como entrada, então pedimos o Espetinho Flor do Ipê (R$ 22), que o originalmente também viria com arroz e cama de abobrinhas, os quais solicitamos gentilmente que não viessem. Então comemos apenas o espetinho, que estava muito bom, com carne macia e suculenta, um gostoso queimadinho por fora, e bem temparada. Aí você vai dizer "mas é só um espetinho". Sim, mas quem nunca comeu um espetinho ruim? Esse era bom.

O simples resolve tudo

A maioria dos pratos principais serve duas pessoas, e fica na casa dos quarenta reais. O cardápio é um pouco caótico, com a descrição dos pratos em português e inglês, e sem muito critério de divisões, além de não ser muito bonito. Acabamos escolhendo os dois únicos pratos individuais listados.

Chris escolheu o arroz à piamontese com filé mignon alto ao molho madeira (R$ 30). Normalmente a gente pede os pratos principais e esquece dos detalhes do que pedimos (isso é mais frequente do que seria salutar admitir). Em geral ficamos papeando, comemos a entrada, e quando vem o prato a gente se pergunta "o que era mesmo?". Tudo isso para explicar que o prato da Chris chegou sem o molho madeira, e ela comeu quase tudo, até que a garçonete o trouxe, pedindo desculpas. Chris não tinha se tocado, embora uma pulga lhe mordesse a orelha dizendo "isso aqui tá meio seco". Mas o bife estava muito bem temperado, embora o ponto tenha vindo o oposto do solicitado: Chris pediu mal-passado, ele veio bem-passado. Nem um sanguinho sequer, tudo cinza. Mas o arroz estava correto, em sabor e textura.

Não xingue, eu disse que as fotos não estavam caprichadas

Minha escolha foi o Lombo Flor de Ipê (lombo temperado com manjericão, crisps de couve, bits de bacon e arroz com castanhas, R$ 30). Extremamente saboroso. E muito suculento, embora não houvesse molho algum. O arroz com castanhas estava molhadinho, e a couve crocante e úmida ao mesmo tempo. O lombo também estava muito bem temperado e macio. Dá para ver que o prato está brilhante por causa do excesso de gordura, mas, veias entupidas à parte, a decisão é perfeita para o prato, que de outra maneira ficaria seco. Pensando agora, acho que foi o tanto que eu gostei do meu prato que fez a gente decidir por incluir o Flor de Ipê aqui no blog.

Ei-lo: o entupidor de aortas!

Devido à pobreza de opções para sobremesa, pensamos em não pedir nada. Mas acabamos optando pelo doce de goiaba (R$ 8). A apresentação pode ser chamada de não-apresentação. Parecia um prato com catchup para molhar batatinhas fritas. Também poderia haver um queijinho para acompanhar. Mas o doce não era ruim, e sua consistência pastosa, mas lisa, não foi um problema.

"Moça, pode trazer as batatinhas"

Assim que chegamos fomos atendidos por uma moça, com touca na cabeça, que parecia funcionária da cozinha. Ela não sabia responder nada do que perguntávamos. Só depois é que chegou a garçonete "oficial", que passou a nos atender. Essa era espontânea a esforçada, mas de vez em quando dava umas sumidas, talvez porque também tivesse funções dentro da cozinha, vai saber. Mas gostamos do jeito dela, que reparou que a Chris tinha ido fumar no jardim, e disse "pode fumar aqui mesmo, o restaurante tá tããão cheio", tirando um sarro da escassez de clientes. Mas, apesar de seus esforços, não podemos esquecer que ela desaparecia às vezes, e que a Chris foi servida sem seu molho madeira.

"...embelezando a paisagem deserta com seu fulgor/de ouro vivo, o Ipê Florido, nos dias de sonho...". Esse é um trecho do poema "Ipê Florido", de Cora Coralina. O Flor de Ipê talvez não seja merecedor dos versos tilintantes da poetisa-mor de Goiás. Mas ambos concordamos que ele mereceria uma segunda visita nossa, caso voltássemos à cidade. Um dos fatores é seu custo-benefício, já que comemos bem por pouco mais de cem reais. Mas há outro pequeno detalhe, igual ao gol no futebol, que faz toda a diferença em favor do restaurante: o tempero. E, convenhamos, essa é a parte mais importante quando falamos em comida. O resto, sim, é que é detalhe.

AVALIAÇÕES (Primeira nota da Chris, segunda nota do Fê; ao lado do quesito está o peso dele na média final):

Ambiente(2): 7,5 e 7
Serviço(2): 5 e 5,5
Entrada(2): 5,5 e 6,5
Prato principal(3): 6 e 8
Sobremesa(2): 4 e 5
Custo-benefício(1): 6 e 8
Média: 5,66 e 6,66
Voltaria?: Sim e sim

Serviço:
Praça da Boa Vista, 32 (fundos) - Centro - Goiás - Goiás
Telefone: (62) 3372-1133
Site: http://www.restauranteflordeipe.com/
Facebook: https://www.facebook.com/restauranteflordeipe/?fref=ts